quinta-feira, 19 de julho de 2018

Sobre a Obra e o Pensamento de Paul Sweezy (1910-2004) 


Marcelino de Carvalho Santana

Dada em níveis distintos, a dificuldade da análise de um pensamento em específico é tão intensa como umaabordagem de um fato histórico. Nesse caso a reflexão ocorre duplicada, ou seja, voltada tanto para o contexto histórico em que determinado pensamento se erigiu, assim como também para as teorias sob as quais este se amparou. No pensamento e na obra do economista estadunidense Paul Marlor Sweezy (1910-2004) estas duas prerrogativas estão muito bem estabelecidas. Como teoria básica tem-se o marxismo, enquanto que como contextualidade histórica delineia-se o New Deal e toda a conjuntura extraída do pós-guerra. De fato, o “pano de fundo” do pensamento deste autor é seguramente muito mais intricado e sincrético do que se possa estabelecer como parâmetro de avaliação.
    A formulação do conceito de capitalismo monopolista obedece a uma seqüência lógica e temporal da tradição marxista iniciada pelo próprio Karl Marx (1818-1883) e continuada por sua posteridade. Essa seqüência foi mantida pelos críticos do imperialista, a saber, Vladimir I. Ulianov Lênin (1870-1924), Gueórgui V. Plekhanov (1857-1918), Rosa Luxemburgo (1870-1919), Nikolai I, Bukharin (1888-1938) entre outros. Concomitantemente, floresceria na Áustria uma fértil escola de pensamento marxista, cuja atividade política operária se mostrou constante. A Escola Austro-Marxista é considerada por muitos como o celeiro da Social-Democracia e suas publicações se tornaram concorrentes das publicações alemãs, a saber, a revista austríaca Der Kampf1, fundada em 1907 por Max Adler (1873-1937) que tornou-se a principal concorrente da alemã Die Neue Zeit2, fundada em 1883 pelo teórico holandês3 Karl Johann Kautsky (1854-1938). Do mesmo modo, é também dessa escola que parte a seqüência da tradição crítica ao capitalismo, proposta mais claramente na obra O Capital Financeiro (1910) de Rudolf Hilferding (1877-1941) na qual o autor aponta o caráter hegemônico do capital controlado pelos bancos em conluio com os industriais.
No entremeio à crítica ao capital financeiro de Hilferding e o capital monopolista de Sweezy, Destacam-se ainda as obras de autores que não pertenciam ao ciclo marxista, mas que também se enveredaram pela crítica aos desmandos do grande capital, cujos efeitos foram sentidos, sobretudo pelos países subdesenvolvidos. Podemos destacar nesse espaço, as obras de John Atkinson Hobson (1858-1940), a qual compõe a crítica ao imperialismo inglês sob a ótica do socialismo fabiano; Gunnar Karl Myrdal (1898-1987) na Suécia, cujas publicações se voltavam especificamente para as regiões subdesenvolvidas as quais se estabeleceram a partir de uma relação de causação circular com os países desenvolvidos; Josef Steindl (1912-1993) economista austríaco que atuou em parceria com o economista polonês Michal Kalecki (1899-1970), o qual havia inaugurado a crítica ao cálculo marginal antes mesmo da Revolução Keynesiana.
    Mesmo as correntes de pensamento econômico independentes, como a de Piero Sraffa (1898-1983) ou a de Mikhail Tugan-Baranovski (1865-1919), apresentam forte influência do marxismo em um momento ou outro. No fértil ambiente onde se formulou o pensamento de Sweezy, destacam-se também as obras de Paul Baran (1910-1964) teórico ucraniano e seu mais importante colaborador nos Estados Unidos; John Kenneth Galbraith (1908-2006), destacado crítico do poder das grandes empresas monopolistas; Charles Bettelheim (1913-2006) teórico francês da planificação econômica socialista; Harry Braverman (1920-1976) fundador do jornal The American Socialist (1954) e teórico do capital monopolista junto a Sweezy e Baran, assim como outros vários.
    Estabelecida a atmosfera intelectual na qual conviveu Sweezy, passemos para aquilo que o autor elegeu com elementos centrais de sua teoria. Assim como essa atmosfera intelectual foi avultada, também foram as críticas e falsas acusações sofridas pela obra de Sweezy no percurso do século XX. A crítica principal norteava sobre uma suposta visão simplista de Sweezy com relação à produção, interpretada como mera combinação entre trabalho e insumos e que resulta em produtos. Marx deixou muito claro em sua obra que sua analise dos modos de produção transcende a constituição da mercadoria, para o autor alemão, o que estava em pauta eram as relações sociais estabelecidas para que a produção dessa mercadoria fosse possível.
    Essa questão envolvendo a produção representa apenas uma das muitas polêmicas em que o pensamento de Paul Sweezy irá se envolver. No entanto, o autor pôde se sobressair em meio a todo esse entrelace metodológico, formulando uma das mais contundentes teses sobre as causa das crises do capitalismo. Até então, todas as hipóteses lançadas para desvendar essa incógnita haviam se mostrado frágeis, ou mesmo, desmentidas pela própria experiência histórica.
    Portanto, sendo dotada de uma historicidade quase que ininterrupta, dado a gama de acontecimentos que se sucederam desde o final da Segunda Guerra Mundial até o ano de sua morte, a obra de Sweezy transcendeu o século XX e permanece atualizada como continuidade à avaliação crítica do capitalismo. Deste modo, torna-se evidente o quão grande são as possibilidades de assimilação e síntese que detém um autor que testemunhou as transformações de seu país por quase três quartos de século.

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